sábado, junho 28, 2008
sexta-feira, junho 27, 2008
Escuto o silêncio protector
dos bombardeamentos de medos,
os coleccionadores de sangue jovial
e o teu vaporoso amor.
São sons que consigo isolar,
definir perfeitamente – um dia foi o teu corpo.
A vantagem de levar um amor para a guerra
é a surdez com que nos fica – resiste ao ferimento.
A paixão que jamais voltará a assolar
antes seja apaziguada a íntima lucidez
imiscui-se no desinteresse súbito
criado em volta das mulheres
– não é mais cativante.
a origem gorava a hipótese da selecção
nem memórias, nem nada.
ostenta vertical o orgulho e ao pescoço
todo o arrependimento que não abordou
Dizia que o amor era uma batalha perdida,
supunha ser um oásis, o próprio
nunca descortinou um inimigo nítido.
nuno travanca
segunda-feira, junho 16, 2008
Estou-me a ver
daqui a dez anos
alcoólico
a regatear os trocos
com umas poesias
com umas filosofias a mais
a ser repreendido
a ser motivo de risota
Alcoólico
a insultar os deuses
a maldizer o mundo
eis-me daqui a dez anos.
A. Pedro Ribeiro
Saio à rua, perdão, avenida. Tiro, do bolso esquerdo, um aglomerado de cartões, representantes de empresas e gente óbvia no geral. Rasgo-os ao meio antes de me sentar numa vaga da esplanada do café de esquina. Peço um café e um bagaço. O cheirinho, sou eu que ministro. Nem sempre foi assim.
Lanço uma gargalhada, para ver se pega. Alguns vizinhos de ocasião olham com estranheza, acabam o seu café e zarpam. Disponho em cima da mesa a maquia certa, para o caso de ter que fugir à pressa. As metades dos cartões voltam à baila. Uno-as aleatoriamente com ajuda de fita-cola que trago para estas ocasiões. De alguma forma transformo todas as entidades em cidadelas comerciais muito mais abrangentes. Algumas delas, num óptimo e renovado negócio.
Passam, à frente da esplanada, duas mulheres altas, provavelmente estrangeiras. Tentam comprar-me a ideia. Recuso. Tudo numa linguagem puramente gestual. Aponto para o final da avenida, como quem diz, desapareçam daqui suas mercenárias proxenetas. Solto nova gargalhada. Talvez o riso fosse compreensível. Desceram a avenida, segundo sei sem qualquer rumo.
Peço a um miúdo que me diga as horas, apenas para lhe interromper a mensagem que inscrevia no seu telemóvel topo de gama. Ele diz-me, sem me olhar: três e meia. Sinto estar atrasado. Pressinto que faltei ao encontro no deserto. Suponho que fosse um chá. Levanto-me sorrateiramente para me imiscuir no mundo, e sigo viagem. Amanhã volto.
quarta-feira, junho 04, 2008
os seus longos dedos viajam entre o branco e o negro sugerindo a harmonia das coisas
o piano de cauda senta-se em bicos de pés faz a vénia quase deitado
o público levanta-se erguendo as mãos efusivas, aplaudem sem mais
e a peça abandona a sala, incompreendida, debaixo de um ruído excessivo, incomensurável, inadiável, que não pode suportar.
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